Não basta suprir as necessidades básicas, o homem precisa de amor
Eu gostaria de começar essa pregação com uma constatação. Corrijam-me se eu estiver errado, mas vocês concordam que somos uns seres constantemente insatisfeitos? Sempre estamos em busca de algo que ainda não temos completamente. Quando conseguimos, logo começamos a procurar outra coisa… A experiência da humanidade é essa. E, quando conseguimos o que não temos, nosso coração se cansa daquilo e buscamos outro objetivo. Desde crianças somos assim com nossos brinquedos. De sonhos em sonhos, de projetos em projetos, percebemos: “Falta algo em mim”.
Vivemos o que podemos chamar de espiritualidade do “quem dera”. “Quem dera eu tivesse um namorado! Eu seria feliz”. “Quem dera eu passasse na faculdade! Eu seria feliz”. Projetamos nossa felicidade num futuro que está por vir e deixamos de viver com intensidade o hoje. Somos como crianças que não se contentam com seus brinquedos.
Todos os homens, de qualquer idade, classe social ou espaço geográfico, experimentam essa necessidade de querer algo mais, uma outra experiência que nos preencha. Sim, é algo entranhado em nossa essência.
Vamos então dedicar-nos a refletir sobre que acontece com nosso coração. Por que essa sede que não se sacia? Para responder essa pergunta, é necessário irmos à origem de tudo, à essência do nosso ser.
Porque ir ao início de tudo?
Vamos fazer uma comparação: lançaram, recentemente, a terceira trilogia da série ‘Star Wars’, e muitos se deram conta de que não sabiam nada de ‘Star Wars’. Então, foram ao início para pegar os primeiros filmes, ao ano de 1977, quando George Lucas lançou o primeiro filme. Assim como não se entende um filme sem entender o seu início, é preciso irmos à origem de todas as coisas se quisermos entender o coração humano. Não entenderemos a nós mesmos se não formos lá no começo quando Deus criou tudo.
Vemos, hoje, jovens debatendo sobre temas polêmicos: família, projetos acerca da punição de menores de idade (a maioridade penal) e vários outros temas que poderíamos citar, os quais têm vital importância para a sociedade. Mas estas são questões periféricas, dependem de outra mais profunda: “Quem é o homem? E o homem não se entenderá sem a referência de Deus, do Criador.
O princípio de todas as coisas chamamos de Deus. Muitos não cristãos chegaram também a essa realidade. Aristóteles, séculos antes de Cristo, chegou ao conceito que chamou de “motor imóvel”, o que nós cristãos chamamos de Deus. Outros filósofos viram isso também, que havia um começo de tudo. Contudo, a revelação cristã nos mostrou algo que a filosofia grega foi incapaz de mostrar.
Deus criou o universo e não o deixou à própria sorte. Spinoza comentava que, propriamente falando, “Deus não ama ninguém”. Esse é o Deus dos filósofos. Em muitos pontos, toca em realidades comuns, mas divergimos no fato de que esse Deus, que criou todas as coisas, ama-nos. Deus é amor. Ele é único, mas não é solitário. Deus é uma trindade de pessoas: um Pai, que ama e gera o Filho; e o Espírito, que é o amor entre o Pai e o Filho.
O Amor é uma Pessoa
O amor não é alguma coisa, o amor não é algo que eu faço, mas sim uma Pessoa, que não tem princípio nem fim, o amor é Deus. E esse amor divino quis criar o universo para que este manifestasse Seu amor. Ele criou os homens para poderem participarem do Seu amor.
Deus nos criou numa efusão do Seu amor trinitário. “O homem é um dom do amor para o amor”, afirmou São João Paulo II. A pergunta “Por que eu existo?” é respondida: “Porque sou um dom do amor e estou neste mundo para amar”. Quanto mais amamos, mais realizados seremos. A santidade que tanto almejamos é a plenitude no amor.
Para amar precisamos ser amados primeiro
Depois dessa longa introdução, chegamos ao ponto: o homem é necessitado de amor. Precisamos amar, mas para amar precisamos ser amados.
Precisamos evitar a religião da obrigação. A pessoa diz: “Eu tenho de ir a Missa, tenho de me esforçar para viver a pureza”. É verdade, é uma obrigação, mas se a pessoa é interpelada pelo amor de Deus, seu relato será diferente: “Eu quero ir à Missa, quero viver a pureza”. A razão é o amor.
Vocês já se perguntaram qual foi a motivação de São Maximiliano Maria Kolbe ao entregar a sua vida por um pai de família? E São Francisco de Assis, que se desfez de todos os bens de sua família? Qual a razão que move essa loucura? Santa Maria Goretti preferiu a morte a se entregar ao homem que queria violentá-la?
Qual a razão desses santos se desfazerem da própria vida em vista de outro bem? Qual é a razão da entrega dos mártires, das virgens? A resposta encontraremos na Palavra: “Nós amamos, porque ele nos amou primeiro” (I Jo 4,19). Por que você vai entregar sua vida? Porque alguém nos amou primeiro.
A resposta dos santos é um passo posterior ao encontro que eles tiveram com Deus. Ninguém dá aquilo que não tem. Esses santos entregaram a vida deles, porque antes Alguém deu a vida por eles.
O mártir cristão morre por alguém que já morreu por ele antes. Fazemos tudo o que fazemos, porque Cristo já fez isso por nós. Madre Tereza não era uma ativista, fez tudo o que fez por amor a Deus.
Papa Francisco vem dizendo que “a Igreja não é uma ONG”. Tudo o que ela faz é porque alguém nos amou primeiro.
Nosso coração anseia por um amor
Deixe eu lhe perguntar neste momento: O que mais deseja o seu coração? Algo você deseja? Você não veio aqui para nada? O seu coração tem anseios profundos? Agora, neste momento, eu gostaria que você se perguntasse. “O que mais eu anseio?”.
Se formos sinceros, vamos ver que a realização dos nossos desejos estão no âmbito de coisas transitórias, a um palmo de nossa realidade. Você deseja entrar na faculdade ou se casar? Quantos sonhos de amor!
Os nossos sonhos, pelos quais temos nos consumido, estão no “nível” de coisas transitórias. Essas coisas passarão e logo buscaremos outras.
O ser humano não se contenta só pelo fato de existir. Os animais, ao contrário, ficam contentes só por existir. Um peixinho, se você lhe der comida e água numa temperatura ideal para ele, estará realizado enquanto peixe. Mas viver por viver não contenta o coração humano. Necessitamos de alguém que nos ame, alguém que nos diga “Que bom você existir!”.
Precisamos fazer a experiência de sermos amados por alguém. A pessoa quando se sente amada, transforma-se e resplandece-se.
Quando uma mulher percebe que um rapaz a está amando, ela resplandece. Até as amigas percebem: “Você está mais bonita!”. Ela renasce, é redimida.
O importante é o ser, não o prazer, nem o ter, nem o fazer
O amor nos faz ser e não simplesmente existir. O amor que experimentamos nos faz reagir. Todas as coisas à nossa volta existem, mas só nós podemos ser amados. Se quisermos colaborar na redenção de alguém, precisamos amá-lo.
Quantos pais deram de tudo aos seus filhos, mas estes se perderam! E ainda dizem: “Eu dei tudo ao meu filho!”. Mas faltou o essencial, faltou o amor.
Os santos foram aqueles para quem faltou tudo, inclusive o material e básico, mas tiveram contato com o amor. Então, foram realizados, foram felizes. De algum modo, mesmo que inconscientemente, buscamos ser amados nos projetos que temos, nos amores que queremos.
Todo mundo busca ser amado. O problema é que nem sempre sabemos onde encontrar o amor que buscamos. Quantos de nós nos traímos para tentar ser amados?
O pecado é uma busca de amor em fontes vazias
Quando o homem busca o pecado, o que ele está querendo ali é buscar alguém que o ame. A castidade não é algo de âmbito puramente biológico. Ninguém morre se não usar sua sexualidade. Se você não tiver relação sexual, você não morre. Necessidade nós temos não de sexo, mas de amor.
Se não andássemos mendigando amor neste mundo, quantas marcas negativas não teríamos em nossa vida! Precisamos buscar as fontes que não secam.
Nós necessitamos de um amor que não pode ser saciado pelas criaturas. E sofremos muitas frustrações por esperarmos das criaturas algo que elas não podem nos dar.
Seu namorado, por mais que a ame, nunca saciará seu coração. A sua namorada, por mais bela que seja, nunca poderá saciá-lo por completo.
Como diz São Paulo: “Tenho certeza de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem as potências, nem a altura, nem a profundeza, nem outra criatura qualquer será capaz de nos separar do amor de Deus, que está no Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8, 38-39).
O amor incondicional
Esse amor incondicional só encontramos em Deus. O amor não pode deixar de amar. Só Deus nos ama com amor incondicional. Precisamos de um amor que não nos decepciona, que não nos frustra. Só Deus ama assim!
Mas é necessário ainda nós nos darmos conta de que Deus nos ama. Quando descobrimos que somos amados, é que nos tornamos cristãos. Quando nos damos conta de que Deus deu a vida por nós, começamos a nos tornar cristãos e descobrimos que somos amados pela fé. Não se trata de sentir Deus, mas perceber que Ele nos ama.
Madre Tereza de Calcutá dizia, em seus últimos anos de vida, que não sentia Deus, mas ela percebia o quanto Ele a amava. Por isso ela ia em frente. É uma percepção de fé.
Deus não nos ama, porque somos bonitos, inteligentes, virtuosos, mas porque existimos. É um amor gratuito, sem merecermos. Ganhar um presente sem merecer nos deixa constrangidos, de certa forma aquilo nos deixa ligados à pessoa que nos deu.
Quando Deus nos ama, também nos sentimos assim, na obrigação de retribuir seu amor.
Senhor, por que me ama? “Porque sim!”, responde Ele.
C.S Lewis diz: “O que precisamos é do amor imerecido”, mas precisamos reconhecer que não valemos nada, mas esse nada é imensamente amado por Deus.
Obrigado Senhor, eu quero esse amor, porque ele nos redime.
Transcrição e adaptação: Sandro Arquejada